PARECER CONSULTA Nº /2011
INTERESSADO: Consº Emmanuel Fortes Silveira Cavalcante
Vice-Presidente do CFM
ASSENTO: Utilização de Jaleco fora do ambiente de trabalho
RELATOR: Dr. CelsoTavares
A utilização de Jalecos fora do ambiente de trabalho, o uso de calçados abertos, crachás com cordão e gravatas, além de adornos como alianças, anéis, pulseiras, relógios, colares, brincos, broches e piercings no exercício profissional por médicos é uma atitude incompatível com o conhecimento científico disponível desde Pasteur e a situação vigente nos serviços de saúde. Equivale, talvez, aos procedimentos retratados por Thomas Eakins, The Gross Clinic, em 1875, com os cirurgiões trabalhando com seus trajes cotidianos, com os quais retornavam aos seus lares, e The Agnew Clinic, em 1879, com os profissionais já vestidos de branco, uma tendência pasteuriana, possivelmente.
O arrazoado sobre a pertinência do vestuário e dos adornos utilizados pelo médico esteia-se em ampla literatura, condensada na particularmente na Portaria N.° 485, de 11 de novembro de 2005, do Ministério do Trabalho e Emprego, que aprova a Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho em Estabelecimentos de Saúde (NR-32) e na NR-06, que dispõe sobre os Equipamentos de Proteção Individual e no Manual de segurança biológica em laboratório, (OMS, 3a ed), quando dispõe sobre a necessidade de se garantir a segurança do profissional e dos cidadãos.
O jaleco é um traje de trabalho e, assim sendo, o seu uso deve ser restrito aos ambientes onde o médico exerce as suas atividades, devendo ser retirado nos intervalos para descanso ou alimentação e ao final da jornada de trabalho. Cabe, portanto, ao profissional, por óbvio, desvesti-lo ao sair do laboratório, clínica ou ambulatório, pois é inadmissível a sua utilização em áreas comuns da unidade de saúde, tais como restaurantes, lanchonetes, salas de estar, repouso, agências bancárias etc., bem como na rua ou, ainda, levá-lo à sua residência (NR-32: “os trabalhadores não devem deixar o local de trabalho com Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e vestimentas utilizadas em suas atividades laborais”).
É um equipamento de proteção individual (EPI) (NR-6: “todo dispositivo de uso individual, de fabricação nacional ou estrangeira, destinado a proteger a saúde e a integridade física do trabalhador”), pois, evitando possíveis contaminações, aumenta a proteção do profissional, mas, considerando-se que alguns espécimes patogênicos podem sobreviver por períodos variáveis na sua superfície, até três meses, fato microbiologicamente comprovado, não é lícito expor terceiros a riscos biológicos tecnicamente evitáveis. Os jalecos são, pois, pelo contato com a pele, líquidos e secreções dos pacientes, verdadeiros fômites, possibilitando a circulação de bactérias multirresistentes por diversos ambientes. A sua higienização deve, então, ser diária, pois eles contaminam-se progressivamente durante os atendimentos clínicos, sendo essa contaminação mais intensa nos bolsos e mangas.
O emprego correto do jaleco, em conformidade com a NR-32, é responsabilidade compartida entre empregado e empregador e o seu descumprimento é passível de multa imposta por auditores fiscais do trabalho e da vigilância sanitária do trabalho. Cumpre ressaltar que, se considerado EPI, o empregador é obrigado a fornecê-lo gratuitamente, de acordo com a CLT (Art. 166, inciso 6.3, subitem A – Art. 167 inciso 6.2).
A proibição do uso de adornos (alianças e anéis, pulseiras, relógios de uso pessoal, colares, brincos, broches, piercings expostos, além de crachás com cordão e gravatas), bem como de calçados abertos é extensivo a todos os médicos. Aqueles, como a gravata, por exemplo, possibilitam a proliferação e disseminação de agentes biológicos pelo fato de não serem lavados regularmente e estes, expõem o calcâneo e o dorso ou as laterais do pé a contaminantes. O entendimento que infecções podem ser disseminadas por esses adereços e a peça de vestuário podem tornar o médico que os usem passíveis das penalidades decorrentes de comportamento negligente .
O empregador deve providenciar locais apropriados para fornecimento de vestimentas limpas e para deposição das usadas, bem como a higienização de vestimentas potencialmente contaminadas, evitando-se o seu manuseio fora do ambiente de trabalho, o que reduziria possíveis riscos para as famílias dos médicos e circunstantes.
Considerando-se o nível de desenvolvimento científico e tecnológico e a potencial gravidade do risco biológico a que expõem os pacientes, a família e a comunidade - uma ameaça à saúde pública não bem quantificada, não mais é aceitável a circulação de médicos em áreas comuns de serviços de saúde e em locais públicos paramentados com jalecos e suas gravatas ou trabalhando com adornos. Cumpre desenvolver campanha publicitária visando à mudança de atitude e que, a partir de então, os profissionais que desconsiderarem essas recomendações sejam advertidos e, na reincidência, penalizados.
Vedar aos médicos que mantêm contato direto com pacientes, ou manuseiem espécimes clínicos, a utilização de adornos, crachás com cordão e gravatas no exercício das suas atividades, bem como a utilização do jaleco nas áreas comuns ou fora das dependências médico-hospitalares, inclusive nas suas residências, para fins de higienização;
Utilizar jalecos exclusivos para cada um dos serviços que o profissional freqüente, inclusive o seu consultório;
Iniciar campanha visando a estabelecer como norma a utilização de uniformes, inclusive calçados, fornecidos pelo unidade de saúde durante a jornada de trabalho, preservando as vestes pessoais, acorde as práticas escandinavas bem sucedidas de controle de infecção. As implicações orçamentárias decorrentes da adoção dessa medida (enxoval, lavanderia, vestuário) seriam compensadas pela redução da morbimortalidade e das despesas referentes a internações prolongadas, UTI, medicamentos onerosos etc;
Maceió, 17 de junho de 2011
Dr. Celso Tavares
Relator