Existem inúmeros fatores que são determinantes para a crise que assola o setor de Urgência e Emergência no Brasil. Aqui, analisaremos os seguintes aspectos:
Dificuldade dos pacientes ao acesso primário de assistência médica.
Grande número de encaminhamentos para hospitais de referência.
Atendimento Pré-Hospitalar.
Atendimento Hospitalar de Urgência.
Dificuldade dos pacientes ao acesso primário de assistência médica.
O Sistema de Saúde no Brasil é extremamente deficiente quanto ao atendimento na assistência primária. A população que depende do SUS não consegue agendar consultas eletivas (aquelas que não são de urgência), nos postos de saúde com médicos clínicos gerais, e a situação é ainda pior quando a população necessita de consultas eletivas com médicos especialistas, como dermatologistas, neurologistas, reumatologistas, cardiologistas, etc, pois estes simplesmente não estão disponíveis para atender a toda a demanda da população. Com isso, as pessoas que necessitam de consultas eletivas, quer seja com clínicos gerais ou com especialistas, procuram espontaneamente os PS dos Hospitais de Referência em Urgência e Emergência, por saberem que ali existem clínicos, cirurgiões e especialistas de plantão para atendimento. Esta fluxo de pacientes com doenças de caráter eletivo que procuram os PS contribui para tumultuar o ambiente nestes setores, além de ser um fator importante na superlotação dos mesmos.
Grande número de encaminhamento pacientes para Hospitais de Referência.
Atualmente o Sistema de Saúde de Urgência e Emergência está estruturado baseado em grandes Hospitais de Referência em Urgência e Emergência, que se localizam nas Capitais ou grandes cidades do País. Idealmente seria necessário que existissem hospitais estruturados em Urgência e Emergência em diversas regiões dos Estados brasileiros, que serviriam de referência para a macroregião onde se localizassem, resolvendo os problemas de saúde daquela região, assim evitando o encaminhamento em massa dos pacientes das cidades do interior para os Hospitais de Referência nas grandes cidades brasileiras, o que leva a superlotação e ao completo esgotamento destas unidades de bem atender a população.
Atendimento Pré-Hospitalar de Urgência
O Atendimento Pré-Hospitalar Móvel de Urgência é feito pelo SAMU, que foi implantado há aproximadamente 10 anos. O SAMU atende pacientes em Urgência e Emergência clínicas ou em acidentes urbanos, fazendo um trabalho de excelência, salvando milhares de vidas de pacientes que anteriormente morriam sem assistência médica.
O problema é que quando o SAMU foi implantado o sistema de Urgência e Emergência Hospitalar já estava esgotado para o atendimento da demanda existente na época. O SAMU trouxe um aumento excepcional na demanda de pacientes extremamente graves para os Hospitais de Referência, o que fez explodir a crise do setor no Brasil, ficando evidente a falta de profissionais de saúde em número suficiente para o atendimento nos Pronto-socorros, especialmente dos médicos, a falta de médicos especialistas, a falta de regulação do sistema, a falta de estrutura de Centro Cirúrgico para atender a demanda, a falta de leitos de CTI para internação dos pacientes necessitados, fazendo com que os mesmos permaneçam intubados e sob ventilação mecânica nas salas de atendimento de Urgência e Emergência dos PS, o que é uma agressão aos cidadãos brasileiros, que em um momento de risco extremo para suas vidas, não têm garantido pelo Estado as condições mínimas de assistência médica que lhes possibilitem chances reais de sobrevivência.
O atendimento hospitalar de Urgência
Neste tópico analisaremos as seguintes condições:
As condições dos Pronto-Socorros
As condições de trabalho do médico
A “vaga zero”
As condições dos Pronto-Socorros
São as piores possíveis, não apenas para os médicos, mas para todos os profissionais de saúde que trabalham no setor. No local existe superlotação de pacientes, que são atendidos normalmente por uma equipe de saúde subdimensionada, gerando grande estresse em todos os profissionais, que trabalham além do limite físico e intelectual para bem atender aos pacientes.
As razões para as más condições dos Pronto-Socorro são: dificuldade de acesso dos pacientes ao atendimento primário; falta de estrutura hospitalar no Interior dos Estados; falta de equipe de profissionais adequada; grande rotatividade de médicos; pacientes atendidos por ordem de chegada, sem Acolhimento com Classificação de Risco, que prioriza o atendimento pela gravidade do paciente, e não por ordem de chegada ao PS; escalas de profissionais incompletas; falta de médicos especialistas de sobreaviso; área física dos hospitais inadequada; falta de leitos de retaguarda; falta de leitos de CTI.
As condições de trabalho do médico
São as piores possíveis, o que faz com que os médicos que trabalham no setor se demitam assim que se estabilizam profissionalmente. Além disso, trabalhar no Pronto-Socorro é colocar-se em risco constante para demandas éticas, legais ou jurídicas. Existem inúmeras razões para estas más condições: na remuneração; péssimas condições de trabalho; jornada de trabalho massacrante; falta de segurança; falta de escala de especialistas; dificuldade de encaminhamento de pacientes.
A “vaga zero”
A Portaria 2048/02 do Ministério da Saúde atribui ao Médico Regulador do Sistema de Urgência e Emergência o grau de Autoridade Sanitária, e determina que o mesmo não deve aceitar a inexistência de vagas nos Hospitais de Referência, “mesmo na situação em que inexistam leitos vagos para a internação dos pacientes (a chamada “vaga zero” para internação)”. Assim, a Portaria autoriza o Médico Regulador a encaminhar os pacientes graves para Hospitais de Referência, mesmo que estes estejam superlotados, sem vagas, sem a menor condição de atendimento.
A “vaga zero” trouxe grande problema para os médicos que atuam no setor de Urgência e Emergência, pois quando os Hospitais de Referência estão superlotados, com as salas de emergência sem condição de atendimento, com paciente graves em macas, no respirador, sem assistência médica adequada e especializada, o Sistema entra em colapso, pois o Médico Regulador não tem para onde encaminhar os pacientes graves que estão nas UPAS, nos Hospitais de menor porte ou nas cidades do interior, ou aqueles atendidos pelo SAMU. Isto tem gerado conflitos entre os médicos do Sistema.
Os desafios da Política Nacional para melhorar as condições do Setor de Urgência e Emergência no Brasil, são: Melhorar o acesso dos pacientes ao atendimento primário; implantação de Hospitais de Referência Regionais; adequar as equipes de saúde dos Pronto-Socorros às necessidades da demanda, especialmente os médicos, com remuneração digna e sem excesso de carga horária; adequar a estrutura física dos Pronto-Socorros às necessidades de atendimento da demanda; estrutura física dos Hospitais adequada; médicos especialistas na retaguarda; implantação do Acolhimento com Classificação de Risco, em que o paciente é atendido pela gravidade do quadro clínico que apresenta, e não por ordem de chegada; campanhas de prevenção para a Epidemia do Trauma; abertura imediata de novos leitos de CTI ou de Unidade Intermediária que permita a alta precoce de pacientes do CTI, assim possibilitando o acesso ao CTI dos pacientes que hoje encontram-se intubados e nos respiradores dos Pronto-Socorros, onde terão o atendimento adequado as suas necessidades, proporcionando-lhes a chance real de sobrevivência, que na situação atual é inexistente.
Este foi o relato geral e superficial das razões da crise no setor de Urgência e Emergência no Brasil. Coloco-me a disposição da Comissão para qualquer esclarecimento necessário.
Mauro Luiz de Britto Ribeiro
Conselho Federal de Medicina