Ex-deputado Talvane Albuquerque e os quatro executores do crime serão julgados em janeiro
Passados quase 13 anos do assassinato da deputada Ceci Cunha (PSDB-AL) - fuzilada com o marido e dois parentes em casa -, a Justiça enfim vai levar os assassinos ao banco dos réus. O júri popular foi marcado este mês para o dia 16 de janeiro de 2012.
O julgamento fechará assim um dos dez casos de impunidade, selecionados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que mais afetam hoje a credibilidade do Poder Judiciário e mancham a imagem do País no exterior.
O ex-deputado Talvane Albuquerque, acusado de ser o mandante do crime, e os quatro suspeitos apontados como autores não têm mais chance de adiar o julgamento. O juiz André Granja, da 1.ª Vara Federal de Alagoas, decidiu que novos recursos, sempre possíveis no sistema penal brasileiro, não terão efeito suspensivo e só serão apreciados depois do julgamento.
Em mais de 12 anos de tramitação, o processo sofreu várias reviravoltas, envolvendo conflitos de competência entre a Justiça Federal e a Estadual, além de sucessivos recursos movidos pelos réus, o que atravancou a ação. Mesmo após a confissão de participantes do assassinato e a conclusão da investigação, o caso ainda não teve um desfecho e os réus estão até hoje em liberdade.
Na varanda. O processo, que forma uma pilha mais de 6 mil páginas em 29 volumes, passou pelas mãos de uma dúzia de magistrados de primeira e segunda instância, além de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Entre idas e vindas, a causa tramitou seis anos na Justiça estadual, até ser reconhecida a competência federal.
Robusto conjunto de provas levantadas pelo Ministério Público não deixa dúvida de que Talvane foi o mandante do crime. A motivação estava ligada ao cargo na Câmara que Ceci conquistara nas urnas. Primeiro suplente, Talvane precisava do mandato e da imunidade em razão de outros processos a que respondia na Justiça, inclusive por assassinato de um radialista em 1994.
Filho cresceu, se tornou advogado e cobra a Justiça
A deputada Ceci Cunha encarna uma dessas comoventes histórias de superação. Filha de pais pobres e sem instrução, ela teve dificuldades para estudar e se formar em medicina. A necessidade de cortar palma quando criança deixou cicatrizes permanentes em suas mãos. Na infância, estudava escondido, à noite, pois a mãe achava que o estudo era perda de tempo para mulheres.
Por conta de seu trabalho como médica, Ceci Cunha elegeu-se em 1988 como a vereadora mais votada de Arapiraca. Em 1994 venceu a eleição para a Assembleia Legislativa de Alagoas e em 1998 tornou-se a primeira mulher alagoana eleita para a Câmara dos Deputados. Em março de 1999, o suplente Talvane Albuquerque chegou a assumir o lugar dela na Câmara, mas logo foi cassado por quebra do decoro, por sua ligação com os pistoleiros presos pelo crime.
Ceci deixou órfãos dois filhos: Adriana e Rodrigo, este com apenas 17 anos à época. O caso demorou tanto a ser julgado que deu tempo de Rodrigo se formar em direito e hoje dedicar os conhecimentos adquiridos no combate à lentidão da Justiça e à impunidade dos assassinos de sua mãe.
Ele criou um blog que acompanha todos os passos do processo. "Foram tantas manobras protelatórias amparadas nas falhas do sistema que, após 13 anos de espera e impunidade, a sensação é de que a justiça não será feita", lamentou Rodrigo. "Eu acredito na condenação dos assassinos, mas o sentimento de justiça se perdeu no tempo."
O caso Ceci foi incluído, em janeiro deste ano, no Programa Justiça Plena, da Corregedoria Nacional de Justiça, que tem a finalidade de monitorar o andamento de processos de grande repercussão social que estão com andamento paralisado. O relator é o juiz Erivaldo Ribeiro dos Santos. "Admitimos todos os recursos e a mais ampla defesa dos acusados, mas o Judiciário não pode titubear e aceitar expedientes protelatórios desse tipo", criticou.
Para ele, o caso desmascara a forma como o Judiciário trata crimes graves envolvendo autoridades ou políticos influentes. "No momento que a imprensa deixa de jogar luz, a Justiça deixa de se interessar e isso não pode acontecer."
Fonte:VANNILDO MENDES, FELIPE RECONDO / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo