Os embargos impostos à carne brasileira por Japão, China e África do Sul nos últimos dias são uma atitude compreensível, mas não refletem um risco real no manejo ou no consumo do produto, disse o veterinário Bernard Vallat, diretor-geral da OIE (Organização Mundial para a Saúde Animal).
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Governo confirma caso "não clássico" de vaca louca no Paraná
As suspensões na importação da carne bovina do Brasil foi desencadeada após o governo admitir um caso "não clássico" do mal da vaca louca ter sido identificado no Paraná, em 2010. Um exame laboratorial conduzido pela OIE confirmou a proteína causadora da doença em uma vaca morta em dezembro daquele ano em uma fazenda do município de Sertanópolis.
Outros países, incluindo Rússia (maior importador de carnes brasileiras), Venezuela(quinto maior) e Irã, dizem estudar a possibilidade de restrição.
A OIE é o órgão internacional responsável por avaliar as ações dos países no combate às doenças animais e mantém o Brasil em sua lista de países com risco "negligenciável" para o mal da vaca louca. "O Brasil tem quase 200 milhões de cabeças de gado", disse Vallat. "Não é um caso que vai mudar a avaliação da OIE sobre o país."
No ano passado, o Brasil foi o segundo maior exportador de carnes bovinas, atrás somente da Austrália.
O diretor-geral da organização aponta outros países com casos identificados da doença, cujo nome técnico é encefalopatia espongiforme bovina (EEB), que também podem ser considerados no grupo com risco negligenciável.
"Mas quando um país notifica a comunidade internacional sobre a existência da doença, principalmente quando é a primeira vez que um caso é detectado no país, é aceitável que outros países adotem embargos à espera de mais informações", disse Vallat. "É uma prática comum."
Ele afirma, porém, que não há riscos para a saúde dos consumidores da carne brasileira. Além de o animal morto ter sido enterrado e não ter entrado na cadeia alimentar, ele observa que o consenso científico atual é de que mesmo o consumo de carne vermelha de animais contaminados não traz problema, apenas o de órgãos contaminados com a proteína causadora da doença, como o cérebro ou a medula espinhal.
NOVAS ANÁLISES
Segundo Vallat, novas análises estão sendo feitas no laboratório de referência da OIE para a doença em Weybridge, no Reino Unido, e deverão fornecer mais informações sobre o animal contaminado no Paraná e trazer pistas sobre a forma de contaminação.
A Abiec (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne) defende que o caso identificado na fazenda de Sertanópolis foi um caso "atípico", gerado por mutações genéticas espontâneas em um animal com idade avançada, e não resultado do consumo de proteína animal contaminada.
Se confirmada a tese, o risco de haver novos casos ou de a doença se espalhar é reduzido. Não há transmissão da doença de animal para animal, e a contaminação ocorre somente pela ingestão de alimento contaminado por proteína animal com a proteína causadora da doença.
A vaca contaminada no Paraná morreu em dezembro de 2010, com 13 anos --idade considerada avançada para o gado. Os primeiros exames realizados no Brasil não identificaram a proteína causadora da EEB, mas uma contraprova feita em junho teve resultado positivo. Uma terceira análise da amostra feita em Weybridge confirmou a doença em 6 de dezembro.
A demora em comprovar o caso no Brasil pode ser considerada normal, diz o diretor-geral, por conta da complexidade da doença. "Ainda existem polêmicas científicas sobre as causas da doença, sobre os diferentes príons [as proteínas causadoras da enfermidade] que circulam nos animais".
Outra questão que deve ser analisada é a forma de contaminação. Como a doença pode ficar latente, é possível que a contaminação tenha ocorrido até 13 anos antes da morte do animal.
A OIE espera obter em algumas semanas o resultado final de sua investigação sobre o caso brasileiro, que deve ajudar a responder essas questões.
IMPACTO ECONÔMICO
Vallat afirma que o atraso na confirmação da doença não indica uma falta de transparência por parte das autoridades brasileiras. "Não há benefício de se esconder um caso da doença para depois confirmá-lo".
Ele disse que os grandes produtores e exportadores de carne agem com bastante cuidado no controle das enfermidades animais, por conta do impacto econômico que um eventual foco de doença pode ter. O Brasil exportou no ano passado 1,1 milhão de toneladas de carne bovina, com um faturamento de US$ 5,4 bilhões (cerca de R$ 11,2 bilhões).
A Rússia, que ainda analisa um possível embargo contra o Brasil, foi o maior comprador de carnes bovinas brasileiras, com 20% do total. O segundo maior comprador foi Hong Kong, com 13%, mas em princípio a exportações brasileiras não serão afetadas pelo embargo chinês.
A China importou diretamente apenas 2.947 toneladas de carne brasileira no ano passado, o equivalente a apenas 0,27% do total das exportações brasileiras no período. O Japão comprou 3.271 toneladas (0,3% do total) e a África do Sul comprou apenas 718 toneladas (0,065% do total).
PRECIPITAÇÃO
O governo do Brasil vem lançando um esforço diplomático para tentar convencer os países que decretaram embargo de que não existe nenhum motivo para preocupação. Missões serão enviadas aos três países que se manifestaram até o momento. O governo também aproveita a visita oficial da presidente Dilma Rousseff à Rússia para evitar que o país siga o mesmo caminho.
A delegação da oficial da visita de Dilma à Rússia incluiu vários representantes de exportadores de carne brasileiros.
Para João Almeida Sampaio Filho, vice-presidente de relações internacionais da Marfrig, um dos maiores frigoríficos do Brasil, as medidas de China, Japão e África do Sul são "alarmistas e desnecessárias".
"O Ministério da Agricultura já deu todas as explicações possíveis e continua dando", disse o executivo. "A própria OIE já disse que não é o caso de mudar o status brasileiro, então a gente acha que houve precipitação.
Folha/BBC
NOTA OFICIAL DA OIE SOBRE A ENCEFALOPATIA ESPONGIFORME BOVINA (EEB)