A bordo de um de seus dois aviões particulares (um Sêneca IV e um Phenom 100), o bilionário José Batista Júnior, acionista da J&F Participações, holding da família que controla o frigorífico JBS-Friboi, a maior processadora de carne bovina do mundo, e várias empresas de outros setores, percorre o interior de Goiás durante três dias por semana. Está em campanha para conseguir apoio de prefeitos e demais lideranças do PMDB para ser o candidato do partido ao governo do Estado em 2014.
Após 36 anos dedicados ao negócio da família, que começou em 1953 com um açougue aberto pelo pai, José Batista Sobrinho - o "Zé Mineiro" - em Anápolis (GO), e tornou-se a maior empresa privada do país, o primogênito da família Batista está transferindo para os irmãos parte de suas ações da J&F (nome que homenageia o pai, José, e a mãe, Flora). De sócio controlador, passou a sócio investidor da holding para se dedicar à política.
Em entrevista ao Valor, Júnior Friboi, como é conhecido, mostrou-se seguro não só da candidatura, mas também da vitória nas urnas. "Estou muito confiante. Goiás vai passar por uma grande alternância. O povo quer mudança, quer algo diferente, quer um gestor. Goiás vai virar uma página", diz. O empresário acha que o momento atual "conspira a favor" de seu projeto eleitoral, porque a população mostra insatisfação com a gestão pública e parece aberta a mudanças.
"Estou feliz. Quero fazer um projeto diferente. Tem dois jeitos de você fazer um projeto social. Do ponto de vista empresarial, dando oportunidade de trabalho e renda para as pessoas, e o outro é fazer uma gestão pública para ajudar o povo", afirma.
De calça jeans e botina com sola grossa de borracha, própria para usar em fazenda, Júnior mostra-se à vontade no contato com a população do interior de Goiás. "Come de tudo e não tem frescura", diz um pemedebista que esteve com o empresário em Maurilândia, onde, num restaurante, pediu à proprietária ovo frito com arroz.
Segundo testemunhas, Júnior abraça todo mundo, adora conversar e costuma perder a hora quando engata uma "prosa". Numa visita a Mutunópolis, demorou tanto a deixar a cidade que o avião decolou no escuro, do meio de um canavial, assustando assessores. "Ir para o interior é tão gostoso, almoçar com o pessoal é uma delícia. O povo é tão carinhoso. É uma alegria."
Vira e mexe surpreende interlocutores tocando um berrante, prática que aprendeu quando acompanhava boiadas. Aliás, chegou a levar o instrumento à boca, na cerimônia de filiação. Mas um assessor tirou de sua mão, antes de tocá-lo.
Filiado ao PMDB há apenas dois meses, em cerimônia que contou com a presença do vice-presidente da República, Michel Temer, presidente nacional da sigla licenciado, e do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), o empresário tem aval da cúpula nacional do partido para concorrer contra o atual governador, Marconi Perillo (PSDB). Mas ainda não tem a candidatura garantida.
Ele tenta, aos poucos, vencer dois desafios: tornar-se conhecido das lideranças, dos militantes e da base pemedebista e ganhar as bênçãos do principal líder do partido em Goiás, o ex-governador, ex-prefeito e ex-ministro Iris Rezende. Aos 80 anos de idade e por duas vezes derrotado por Marconi, Iris ainda é o nome preferido de setores do PMDB e não desestimula seus apoiadores.
Ele não foi ao ato de filiação do empresário, em 15 de maio, e demorou a aparecer em evento público ao lado de Júnior. Mas, recentemente, estiveram juntos em reunião do partido e tiveram um encontro privado, na fazenda do ex-governador. Foi no domingo, 30 de junho. Num passeio de caminhonete, Iris mostrou a propriedade a Júnior e, na conversa sobre política, reforçou o conselho para ele continuar as viagens pelo interior, para se aproximar da base do partido e construir a candidatura.
"O empresário entra na política pensando no "fazer". Entra para "servir" e não para "se servir" do Estado"
Para Júnior, trabalhar não é problema. Desde a filiação, já visitou cerca de 200 dos 246 municípios do Estado. "Tenho andado, visitado os municípios e ouvido as pessoas, para detectar as necessidades reais e montar um plano de governo para Goiás", afirma. O pré-candidato aponta as vantagens de um governador com origem na iniciativa privada. "Os projetos políticos sempre foram feitos por pessoas que entraram na política pensando no poder. Não é no "fazer". O empresário entra na política pensando no "fazer". Constrói patrimônio e "expertise". Entra para "servir" e não para "se servir" do Estado."
Nas reuniões políticas, em geral começa falando do sucesso empresarial da família, que levou o nome de Goiás para o mundo - "from Goiás", gosta de dizer. Sua história de sucesso empresarial e de vitória pessoal é mostrada como exemplo. Para ele, é possível levar para a gestão pública a forma de comandar uma empresa privada, apesar das necessidades de "acomodar a base e de acordos políticos", práticas exigidas na administração pública.
A holding J&F Participações controla o frigorífico JBS Friboi e outras empresas, como a fabricante de celulose Eldorado, o Banco Original, de laticínios Vigor e Itambé e a companhia de produtos de higiene e limpeza Flora. "Agora, com a Seara, somos a primeira empresa privada brasileira. Estamos perdendo somente para a Petrobras, que é estatal", diz.
Júnior tem 53 anos de idade. Sete anos antes de seu nascimento, "Zé Mineiro" abriu uma casa de carnes em Anápolis, onde "matava um boi por dia". Em 1955, foi pioneiro no fornecimento de carne para as cozinhas industriais das empreiteiras que construíram Brasília. "Levava o boi até Brasília, tocado nas comitivas, por terra. Chegava em Brasília, desossava a carne toda e levava para as cozinhas dos canteiros de obra. Viajava 14, 15 ou até 20 dias até chegar", conta o empresário.
O neo-pemedebista é o mais velho de seis irmãos (três homens e três mulheres). "Não sou o mais velho. Nasci primeiro", corrige, bem humorado. Começou a trabalhar com o pai aos 15 anos. Foi passando por todas as etapas do negócio até assumir a empresa aos 20. Casou aos 21. Perguntado se é o principal responsável pelo crescimento do grupo, responde, apenas, que começou "lá de baixo, quando não tinha praticamente nada".
Mas Júnior Friboi, cuja empresa sempre foi generosa doadora de campanhas eleitorais, promete que, se for confirmado candidato, não aceitará contribuição privada em troca de exigências de contrapartida, em caso de vitória. "Primeiro, eu não trocaria minha integridade, saindo do conforto que tenho hoje, para entrar nesse mundo da corrupção. Não vou fazer isso. Tenho uma família e responsabilidade muito grande", diz.
Ele afirma que, se receber esse tipo de oferta de uma empresa, vai recusar e procurar a contribuição de outras que queiram financiar sem exigir nada em troca. "Se for para eu aceitar exigência em troca de doações, como entrar no mundo da corrupção ou lotear o Estado, perco a credibilidade, a governabilidade e a integridade. Hoje, não preciso disso. Eu poderia fazer uma campanha sem entrar nesse mundo. Nós estamos todos precisando combater a corrupção."
Júnior assina filiação sob o olhar de Temer: declarações contra Perillo levaram governador a interpelar judicialmente o empresário
Na reuniões políticas, Júnior admite ser "verde" em política e diz que não faz promessas, até porque ainda nem candidato é. Ele defende ações, como um choque de gestão profundo, reforma fiscal que dê a Goiás capacidade de investimento, efetiva implantação de projetos de política pública - "até hoje, o que tivemos foi só promessa" -, uma política de valorização e qualificação dos servidores e a implantação de escola técnica para treinar os jovens, para que o Estado esteja preparado para um grande investimento na produção, na industrialização e na tecnologia.
Por declarações feitas por Júnior contra a atual gestão, na cerimônia de sua filiação ao PMDB, o governador protocolou interpelação judicial contra o empresário. Quer que o pemedebista esclareça as declarações. No discurso, ele afirmou ter apoiado a eleição do tucano, mas que, "infelizmente, o que era esperança virou pesadelo quando a verdade veio à tona. Corrupção, tráfico de influência, patrimônio não explicado, arapongagem, jogo do bicho. Um jeito velhaco de brincar com o dinheiro público".
Apesar da simpatia inicial pelo PSDB, Júnior entrou efetivamente na política em julho de 2011, quando se filiou ao PSB. Ele presidia o partido até o dia de sua filiação ao PMDB. Argumenta ter decidido deixar o PSB porque não quer deixar de apoiar a presidente Dilma Rousseff. E o presidente nacional do PSB, o governador Eduardo Campos, é pré-candidato a presidente, com perspectiva de ter de adotar discurso de oposição a Dilma.
Júnior nega que tenha se filiado ao PMDB por sugestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se especula em Goiás. Para conquistar o apoio da base, o empresário e seus aliados rejeitam a tese que sua filiação tenha resultado de uma operação "de cima para baixo". O PMDB de Brasília não nega que se empenhou em atrair Júnior, assim como empresário Josué Gomes da Silva, da Coteminas, filho de José Alencar, vice-presidente no governo Lula. A intenção do PMDB era fazer de Josué, também cortejado pelo PT, candidato a uma vaga na eleição majoritária.
Em Goiás, é forte a parceria entre PT e PMDB. A provável chapa majoritária em 2014 deverá ter um pemedebista candidato a governador e um petista na vaga de vice. Para dirigentes do partido, a composição ideal seria essa, com o ex-governador Iris Rezende disputado o Senado, mandato que já ocupou.
As notícias de que sua filiação ao PMDB tenha relação com os investimentos feitos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no Friboi também são rejeitadas pelo empresário. "Nada, zero. Nada a ver uma coisa com a outra", garante. Considera as operações do BNDES normais e defende o direito do Friboi. "O BNDES passou a dar oportunidade para empresas brasileiras quebrar paradigmas, internacionalizar o povo brasileiro e os produtos brasileiros e quebrar barreiras comerciais." Diz que empresas que têm projeto e garantia são beneficiadas. "Não somos diferentes dos outros. Não estão dando nenhum privilégio para nós. Estão tendo resultado. São acionistas", afirma
Wesley e Joesley Batista são os irmãos do empresário à frente da J&F. Júnior está transferindo ações para os irmãos, para deixar o negócio da família fora da política. Mas não abandonou totalmente a iniciativa privada. Tem sua própria holding e pretende investir em projetos de agropecuária e imobiliários. Às segundas e terças-feiras fica em Goiânia, cuidando da empresa. De quarta-feira a sábado, percorre municípios do interior do Estado. Ele pretende se dedicar a esta pré-campanha até julho do ano que vem, quando a candidatura será - ou não - confirmada.
Júnior costuma viajar com uma equipe pequena de assessores e políticos aliados e dois objetos que parecem deslocados na figura de um empresário tão bem sucedido: uma caneta bic no bolso, que usa com frequência para fazer anotações durante as conversas, e seu telefone celular pessoal (um outro, mais moderno, fica com assessores), um modelo pequeno e antiquado e sem acesso a internet, que raramente se vê hoje em dia.
Autor(es): Por Raquel Ulhôa | De BrasíliaValor Econômico - 15/07/2013 |