A promulgação da MP mais médicos certamente não poderá ser aceita como o fim de uma novela cujo roteiro vem sendo percorrido há anos por um governo que pauta suas ações de olho em pesquisas eleitorais.
As discussões e manifestações médicas, inclusive com muitos atos públicos, que antecederam este momento, foram em grande medida eclipsadas por posicionamentos desfavoráveis a nós, especialmente por parte da imprensa.
Parece que o PT consegue transformar toda discussão que requeira posicionamentos e seriedade de alternativas em uma luta entre os poderosos e os oprimidos. E nesta guerra pela primazia na comunicação, temos que reconhecer sua competência, além de contarem com a cumplicidade de boa parte da imprensa que por má fé ou desconhecimento, ou até pelo interesse jornalístico do fato, prefere reduzir a mais elevada preocupação de nossa classe com a saúde da população a mero interesse corporativo.
Pouca ou nenhuma menção a uma categoria que em sua esmagadora maioria se dedica diuturnamente a ajudar pessoas e a zelar para que haja mais felicidade e saúde nas famílias brasileiras. Que enfrenta desafios e provocações dos planos de saúde e não deixa que este ambiente contamine a sua relação com os tão necessitados pacientes que pagam caro para chegar até nós. Que prossegue aperfeiçoando-se e interessada em sua ciência e em sua prática apesar da remuneração aviltante que recebe em muitas de suas atividades.
Algumas opiniões e artigos um pouco mais equilibrados apontaram os excessos de ambos os lados, até com menção a interesses eleitorais futuros de governantes e a construção de candidaturas com a tese e a plataforma de defesa da saúde. Porém, quase invariavelmente fomos condenados por aparentemente só agora nos interessarmos pela saúde pública no Brasil.
Neste sentido creio que devemos aprender muito com este fato e não mais nos omitirmos com relação ao importante papel que as sociedades de especialidade devem desempenhar na interlocução com a sociedade civil.
Organizar registros de procedimentos, cada qual em sua área, destacando, através de comparações entre instituições, as diferenças de tratamento que os brasileiros pobres recebem em relação aos ricos.
Utilizar estes dados e denunciar o baixo índice de tratamento adequado que pacientes graves recebem como por exemplo em minha especialidade, a reperfusão arterial eficaz no infarto agudo do miocárdio.
Em suma, mudar e ampliar o foco de sociedade científica para alcançar seu verdadeiro papel social, orbitando em torno de uma AMB unida, focada e prestigiada por todas suas especialidades coligadas.
Mais que constranger o governo e responder a estes comentários maliciosos e tendenciosos estaremos cumprindo nosso papel de cidadãos.
Jamil Abdalla Saad
Cardiologista em Belo Horizonte - MG
Ex-presidente da Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista (1998-2002)
Presidente da Sociedade Latinoamericana de Cardiologia Intervencionista(SOLACI)