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Na URSS: "feldsher", "feldsher" de saúde, técnico de laboratório, parteira, enfermeira, ajudante de odontologia e protético. As escolas técnicas para a formação desse pessoal excedem a 650 e os alunos matriculados são estimados em 400.000. O "feldsher" tanto auxilia o médico como pode trabalhar sozinho, sob supervisão.
O emprego de auxiliares de saúde em áreas em desenvolvimento: breve histórico
Use of auxiliary public health personnel in developing areas: a brief historical approach
Nilton Tornero
Do Departamento Materno-Infantil e Saúde Comunitária do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Estadual de Londrina Campus Universitário — Caixa Postal 2111 — 86100 — Londrina, PR - Brasil
RESUMO
A utilização de auxiliares de saúde como uma medida que pode melhorar a cobertura sanitária principalmente dos países ditos em desenvolvimento, foi analisada sob o ponto de vista histórico, com a finalidade de mostrar que as razões pelas quais os auxiliares de saúde são introduzidos nos diversos países são diferentes e não direcionados pelos mesmos propósitos. Procurou-se discutir, sucintamente, alguns exemplos ilustrativos. Na URSS os auxiliares de saúde ("feldshers") existem como parte integrante da atenção sanitária, desde o século XVIII; hostilizados inicialmente pela Revolução Socialista, foram considerados a seguir como o alicerce do sistema sanitário. Na África e Ásia foram julgados como um dos produtos do colonialismo europeu. Na China — experiência recente em grande escala — acompanharam as mudanças radicais ocorridas naquele país. Se o emprego dos auxiliares é recomendado principalmente para os países em desenvolvimento, o que se verificou é que na prática 83,1% das escolas de nível secundário catalogadas estão em países desenvolvidos, detendo o maior número de alunos.
Unitermos: Saúde pública, pessoal auxiliar. Saúde pública, países em desenvolvimento.
ABSTRACT
A study of the use of auxiliary public health personnel in some developing countries areas of the world concludes that the factors which prescribe this practice vary according to the politics dominant at the time.
Uniterms: Allied health personnel. Public health, developing countries.
1. INTRODUÇÃO
Para a OMS 5 (1968), "o termo "auxiliar", em sua concepção corrente, tem um sentido genérico: refere-se a todo pessoal sanitário de categoria não profissional que ajuda uma pessoa portadora de um título profissional". Segundo esta mesma fonte, um auxiliar, para as Nações Unidas, é entendido como sendo "um trabalhador remunerado que, sem possuir todos os títulos exigidos em uma especialização técnica determinada, colabora com um profissional e atua sob sua direção".
O auxiliar freqüentemente leva o nome da categoria profissional que é treinado para ajudar e da qual recebe supervisão. Assim, fala-se em auxiliar de medicina (ou assistente médico ou equivalente), auxiliar de enfermagem, auxiliar odontológico.
Uma análise, ainda que sumária, de como o uso dos auxiliares tem se desenvolvido com o tempo será útil para mostrar a íntima relação existente entre eles e as políticas dominantes em determinados momentos. A discussão dar-se-á em 4 fases: na primeira, far-se-á um histórico da introdução dos "feldshers" na URSS; na segunda, será analisada a introdução de auxiliares em países em desenvolvimento; na terceira, alguns aspectos inovadores da experiência chinesa serão comentados e, por fim, algumas informações sobre a situação atual.
2. OS "FELDSHERS" E A URSS
Esta discussão tem interesse porque foi a URSS o primeiro país a adotar, em nível nacional, o uso de pessoal intermediário, isto muito antes que a discussão do tema se tornasse relevante, pois esta experiência teve início por volta do século XVII. Neste século já foram criados estabelecimentos para o treinamento de pessoal de nível intermediário para trabalhar em hospitais, conforme informações da OMS6 (1975).
Todavia, os "feldshers" foram introduzidos mais tarde, por volta de 1700, nas forças armadas, tomando-se como modelo os auxiliares das forças armadas alemãs, chamados "barbeiros de campo". Isto se explica porque, durante os séculos XV a XVII, os barbeiros foram utilizados na Europa como cirurgiões das forças armadas e, segundo Flahault2 (1974), eram conhecidos como "feldshers".
Note-se que esses auxiliares, os quais deram origem aos "feldshers", como os próprios, foram utilizados primeiramente para atender às necessidades das forças armadas. Isto se prolongou por vários séculos, inclusive no atual, como ainda será visto.
Ainda no século XVIII iniciou-se o treinamento dos "feldshers" através de corporações locais que, dentro de limites bastante definidos, dirigiam e administravam os serviços de um distrito da Rússia antiga. Entre suas responsabilidades figurava a organização dos serviços sanitários. Este fato leva a supor que, treinados pelas corporações, sua atuação logo se expandiu além dos limites das forças armadas para prestarem serviços às comunidades. As funções desses auxiliares ficam mais claras quando se lê que "uma vez completados os estudos, os "feldshers" ingressavam nos estabelecimentos sanitários do "zemstvo" (corporação) como ajudantes dos médicos e, às vezes, como seus suplentes. Também havia, em grande número, postos de "feldsher" ou de "feldsher"-parteira a cargo de uma só pessoa para a prestação de assistência médica em zonas rurais"6.
Observe-se que os mesmos, por essa época, já eram treinados para a prestação de serviços em zonas rurais, onde deveria estar a maioria da população. É interessante assinalar o aparecimento concomitante de uma outra variedade de "feldsher": o "feldsher"-parteira. Depreende-se, pois, que desde o século XVIII já havia uma organização sanitária nacional, na qual os "feldshers" tinham grande importância. Seus trabalhos eram supervisionados pelas corporações. A duração dos cursos era de 3 anos. Segundo a publicação citada, os candidatos deveriam ter entre 15 a 20 anos, sabendo ler e escrever.
Nos primórdios do século XX as escolas para formação de "feldsher"-parteira haviam tomado grande impulso; a duração do curso foi ampliada para 4 anos.
"Esta classe de pessoal", segundo o mesmo documento da OMS, "que combinava as funções de "feldsher" e de parteira era muito útil para o "zemstvo" por razões econômicas, ainda que seu treinamento fosse menos completo que o daqueles que se preparavam para um só desses tipos de trabalho". O argumento econômico, já empregado naquela época, não perdeu sua utilidade; pelo contrário, é citado por todos quanto se dedicam a estudar este assunto. Na Tanzânia, por exemplo, segundo Gish 4 (1973), a formação de um médico graduado em 5 anos (incluindo a escola secundária e a médica) custa £ 15.000, enquanto que a formação de um auxiliar médico rural custa £ 600 (somente a formação médica).
Com a vitória da revolução socialista, em 1917, reformas radicais ocorreram em todos os setores da sociedade e entre estes o setor saúde. As primeiras atitudes em relação aos "feldshers" foram de hostilidade. Sidel 8 (1974) explica que "em 1918... foi decidido colocar à parte os "feldshers" e substituí-los por médicos regularmente treinados. Todavia, a dificuldade de recrutar médicos que se dispusessem a atuar nas áreas rurais tornou impossível oferecer serviços de saúde adequados sem os "feldshers". Em decorrência disto, as várias escolas de "feldshers" foram unificadas em nível nacional, passando a depender diretamente de uma Comissão Nacional de Saúde.
Atualmente existem 7 categorias de pessoal intermediário na URSS: "feldsher", "feldsher" de saúde, técnico de laboratório, parteira, enfermeira, ajudante de odontologia e protético. As escolas técnicas para a formação desse pessoal excedem a 650 e os alunos matriculados são estimados em 400.000. O "feldsher" tanto auxilia o médico como pode trabalhar sozinho, sob supervisão. As funções desses profissionais e outros detalhes técnicos podem ser encontrados na publicação da OMS 6.
O exemplo da URSS mostra que há séculos pessoal auxiliar já era empregado pelo menos em parte do país, sendo as vantagens de seu uso já há muito comprovadas, mesmo considerando-se a Rússia atrasada dos séculos anteriores. A mudança política do regime soube ver, pela prática, as vantagens do uso desse profissional e aperfeiçoar o sistema de prestação de serviços, estendendo-o a toda a população. Ao pessoal auxiliar, entre eles os "feldshers", foi dado papel importante no processo, de modo que hoje constituem peça fundamental no mesmo, permitindo levar assistência sanitária de boa qualidade às mais distantes regiões do território. O exemplo soviético mostra também que os auxiliares não devem existir somente em regiões em desenvolvimento e com carência de médicos: na URSS existem cerca de 375 habitantes por médico, uma das proporções mais altas do mundo, sendo que, de um modo geral, há um trabalhador sanitário para cada 100 habitantes 8.
De maneira análoga, países desenvolvidos, como os Estados Unidos e o Canadá, têm dado ênfase crescente ao treinamento de pessoal auxiliar de nível intermediário.
2. INTRODUÇÃO DE AUXILIARES NAS ÁREAS EM DESENVOLVIMENTO DA ÁFRICA E DA ÁSIA.
É na África que estão localizadas as escolas técnicas mais antigas para formação de pessoal auxiliar (assistentes médicos ou terminologia vária porém semelhante, de nível intermediário) das áreas em desenvolvimento. Com efeito, as informações disponíveis indicam que as mais antigas delas, até hoje operando são, uma existente em Malawi, fundada em 1910, outra no Sudão (1918) e uma terceira em Ruanda (1944)12.
O emprego de auxiliares, tanto no continente africano como asiático (neste último exclui-se a China) foi motivado por razões bastante diferentes daquelas concernentes à URSS.
Primeiramente tem-se que levar em conta que a maioria desses países eram, muitos até recentemente, colônias, cujas metrópoles estavam na Europa, como Inglaterra, França, Bélgica, Portugal. Nas colônias existia uma minoria de pessoas oriundas das metrópoles que detinham o poder político e econômico e as governavam. Em geral, aliavam-se a nativos das elites locais, como respaldo popular ao governo alienígena que representavam. Ao lado dessas elites havia as forças armadas, quer autóctones ou não, porém comandadas por oficiais da metrópole e cujo objetivo era ajudar a manter o poder da metrópole pela força, quando necessário.
É fácil compreender, pois, que os recursos de saúde estavam concentrados a serviço dessas elites. Médicos nativos, por exemplo, formados nas colônias, praticamente não existiam, porque não havia escolas. Os médicos e outros profissionais de nível superior eram importados da metrópole, conforme as necessidades dessas elites e de seus negócios. Os nativos, se pertenciam à elite local, poderiam ter o privilégio de cursar universidades na metrópole, retornando para servir a elite a que pertenciam. As necessidades do povo não eram levadas em conta.
Alguns exemplos deixarão bem claro o exposto. Gish4 (1973) diz que "durante o período colonial, 'a medicina que convinha' na Tanzânia era basicamente confinada a europeus (mesmo os médicos asiáticos recrutados para trabalhar na África eram geralmente do tipo licenciado e não do tipo registrado). Africanos podiam tornar-se assistentes médicos e aqueles que tiveram êxito neste trabalho de alto prestígio... eram freqüentemente homens importantes. Mesmo com o alto prestígio alcançado, o auxiliar médico estava em posição nitidamente inferior aos médicos".
Gish deixa claro que mesmo os auxiliares africanos saiam das elites e que a profissão era considerada de alto prestígio entre os africanos; porém, ern relação aos médicos europeus (e, por extensão, ao colonizador) eram considerados profissionais de categoria bastante inferior.
Outro país que ilustra bem este caráter elitizante do pessoal sanitário nas colônias foi o Vietnã, na época em que era colônia francesa. Na década de 30 havia dois tipos de médicos no Vietnã: os médicos "franceses", ou seja, formados em medicina ocidental e os médicos indo-chineses, cultores da medicina tradicional. Os médicos ocidentais estavam em Hanoi e Saigon, as duas principais cidades do Vietnã, onde deveria estar todo o "staff" governamental, enquanto os médicos indo-chineses distribuiam-se pelo resto do país. Porém, como esclarece Cua1 (1974), "a categoria dos médicos indo-chineses foi mais tarde abandonada e a Escola Médica de Hanoi passou a treinar médicos no estilo francês..."
Que grande número desses médicos e auxiliares existiam em função das forças armadas, parece não haver dúvidas. Em relação à África, Flahault3 (1974), diz que "no início do século XX, devido a escassez do "staff" médico nas forças armadas e a necessidade de atender a cobertura sanitária, a 'Escola de Dakar' desenvolveu-se e tornou-se a principal fonte de assistentes médicos para todos os territórios (colônias) de fala francesa".
Do exposto deduz-se que, se alguns auxiliares foram treinados para servir à população, o foram em pequeno número, assumindo a cobertura sanitária aspecto secundário aos olhos dos colonizadores.
Quais as conseqüências dessa política de saúde? Conforme esses países foram alcançando suas independências, colonizadores e o "staff" médico que os serviam embarcavam para a metrópole no mesmo navio. Assim o Congo, à época da independência, pôde se dar ao luxo de não ter um médico congolés em seu território2. No Vietnã, após a saída dos franceses, grande número de médicos franceses e das forças armadas regressaram à França. Dada a escassez de pessoal que se seguiu, o Ministro da Saúde se viu na contingência de treinar auxiliares médicos em 3 anos 1.
Viu-se que a população não tinha acesso aos serviços sanitários; com a saída desse "staff" a situação, para ela, pouco ou nada se alterou. Os governos que se sucederam ao colonizador, porém, viram-se frente a um problema espinhoso: não havia pessoal sanitário no país nem para salvar as aparências.
Por outro lado, a existência de auxiliares foi vista, pela maioria dos novos governos, como vestígio do colonialismo. Mesmo naqueles países que tinham, desde a época colonial, uma certa infra-estrutura no treinamento de auxiliares, não a aproveitaram de imediato. E é Gish4 quem explica: "... a categoria 'auxiliar médico' passou a ser vista como uma invenção colonial, cujo objetivo era manter o africano distanciado da verdadeira prática médica. Subseqüentemente, com a independência, houve um retrocesso no treinamento de auxiliares médicos". Ainda segundo esse autor, um outro fato ocorre: rapidamente formou-se no país recém-independente uma nova elite indígena (autóctone) cujas aspirações eram idênticas às dos colonizadores que haviam partido. Essas elites tentaram resolver o problema copiando as ex-metrópoles européias, construindo grandes hospitais com médicos altamente especializados.
Todos esses fatores contribuíram para que o emprego de auxiliares fosse relegado a segundo plano, dentro das prioridades sanitárias.
Essas políticas, no entanto, pelo menos ao que se sabe, foram revistas em vários países que procuram resolver seus problemas sanitários de maneira própria, deixando de lado os modelos importados. E os auxiliares passaram a ser vistos de outro modo, agora não como fruto do colonialismo, mas sim como peça fundamental da organização sanitária que visa levar assistência sanitária a toda a população, com melhor aproveitamento dos recursos, pelo desenvolvimento de um modelo hierarquizado de prestação de serviços.
Atualmente, segundo a OMS12 (1976) existem 42 escolas para formação de auxiliares médicos de nível intermediário na África, distribuídas por 20 países; dessas 42 escolas, 15 estão na Tanzânia; a maioria foi fundada a partir da década de 60. Pelo número de alunos matriculados, pode-se inferir a importância que determinado país dá ao problema: no Congo existiam, em 1973, apenas 12 alunos matriculados; na Libéria 20 e 30 em Madagascar. No entanto havia 1.067 na Tanzânia e 800 na Guiné. As funções descritas para os auxiliares formados em cada país não permitem saber, com exatidão, muitas vezes, suas verdadeiras funções. Considerando-se, na descrição das funções, que esteja escrito literalmente que os auxiliares diagnosticam e tratam doenças (parte integrante do conceito de auxiliar médico), tem-se que isto ocorre em 11 dos 20 países africanos.
Na Ásia, excluída a China, existem 15 dessas escolas, catalogadas na publicação referida da OMS, distribuídas por 7 países; 6 delas estão na Tailândia. O número de alunos tende a ser maior que em muitos países africanos. Algumas dessas escolas foram criadas a partir da década de 50. Em 3 países os auxiliares diagnosticam e tratam doenças, conforme o critério classificatório utilizado.
3. ALGUMAS INOVAÇÕES DO MODELO CHINÊS
Após o "redescobrimento" da China pelo mundo ocidental, muito se tem falado sobre a saúde naquele país principalmente sob a forma de artigos escritos por visitantes, oficiais ou não, de diversos países.
Várias particularidades do modelo chinês têm sido discutidas, abrangendo a organização do sistema sanitário, a formação e funções dos recursos humanos, a distribuição dos recursos e outros específicos. A discussão seguinte, basear-se-á, em grande parte, em informações colhidas em dois trabalhos de Smith 9,10 (1974).
Vários trabalhos chamam a atenção para o grande progresso alcançado pelos órgãos de saúde naquele país no controle ou erradicação, em poucos anos, de várias endemias que há muito tempo provocavam danos no país. Dentre estas pode-se citar o controle de esquistossomose, já erradicada em várias regiões, o controle do calazar, das doenças venéreas, a erradicação da peste, cólera, varíola; os progressos feitos em relação à malária e à filariose. Fala-se que as grandes endemias estão sob controle.
Smith e Adey 11 (1974) advertem que "a organização e a prestação dos cuidados médicos não podem ser separados do modo global de vida existente na República Popular. De fato, o principal interesse de um médico que visita a China pode voltar-se antes para a sociedade do que para a medicina".
É justamente para esclarecer este aspecto o objetivo desta discussão. Tal êxito no controle dessas endemias foi devido principalmente a três variáveis: o papel desempenhado pelos "médicos descalços", o papel desempenhado pelas populações e as relações existentes entre esses "médicos descalços" e essas populações.
Smith9 (1974) e também outros autores chamam a atenção para a impropriedade do termo "médico descalço". Ele é errôneo tanto no substantivo como no adjetivo. O "médico descalço" não é um médico — nem ele nem a população julgam-no médico — nem anda descalço. Smith esclarece que eles "são camponeses aos quais se tem dado alguns treinamentos médicos básicos, oferecem tratamento médico simples ou conselhos, porém continuam também a exercer o seu trabalho agrícola". É, pois, um auxiliar de saúde em tempo parcial exercendo seu trabalho sanitário juntamente com seu trabalho agrícola; não recebe pagamento específico pelo trabalho sanitário, mas sim como camponês em tempo integral. Esta dupla função é que constitui uma das grandes inovações do modelo chinês. Os "médicos descalços" são considerados elementos chave no sistema de prestação de serviços.
Surgiram, juntamente com outras mudanças, em elevado número, ao final da década de 60, quando houve grande discussão em torno da assistência médica e observou-se claramente que a população rural estava mal assistida quando comparada à urbana. Para fins administrativos a unidade demográfica rural chinesa é a comuna; cada comuna tem cerca de 200 pessoas; entre estas, atualmente, 2 ou até 3 são desses auxiliares. Diagnosticam e tratam doenças simples, porém, como diz Smith9 (1974) "sua principal tarefa está na educação sanitária e na medicina preventiva".
As autoridades sanitárias compreenderam que as endemias só poderiam ser controladas com a participação ativa e maciça da população, principalmente a rural. Foram levadas a efeito campanhas, visando determinados fins, nas quais as populações participaram ativa e maciçamente: são as chamadas "Campanhas Patrióticas Sanitárias". A primeira delas ocorreu no início da década de 50 e o objetivo era a eliminação das 4 "pragas": moscas, mosquitos, ratos e percevejos, campanha esta coroada de êxito. Para o sucesso de outras campanhas que se sucederam, o papel dos "médicos descalços" foi decisivo pois, trabalhando juntamente com a população em seus afazeres agrícolas cotidianos, podiam, ao mesmo tempo, discutir com ela os problemas sanitários. Smith10 (1974) diz que "os "médicos descalços" têm sido responsáveis pela manutenção do entusiasmo pelas campanhas patrióticas sanitárias a nível das comunas". São eles que, decidida a preparação de uma campanha, levam o problema à comuna, discutem, esclarecem, ouvem opiniões, projetam, motivando-a para a tarefa. Somente isto seria capaz de derrotar uma endemia como a esquistossomose da maneira como foi feito.
Tradicionalmente, nos vários países, o pessoal sanitário é pago pelo Estado ou outras instituições. No caso chinês, existe um pessoal que se poderia chamar de para-sanitário: trabalha em saúde, faz parte da rede sanitária, sendo dela elemento chave, porém não recebe do Estado para exercer essa função. Quando a população inteira participa na resolução dos problemas, este conceito amplia-se ainda mais: a comunidade passa a trabalhar para o seu próprio benefício. Deixa de ser meramente receptora para tornar-se indutora e responsável pelas mudanças.
4. SITUAÇÃO ATUAL DOS AUXILIARES
Publicação recente da OMS12 (1976), relaciona as escolas para a formação de assistentes médicos (nível intermediário somente) existentes no mundo, por volta de 1973. As escolas são arroladas por país, contendo informações várias, como: ano de início de funcionamento da escola, número de alunos matriculados, duração do curso, formação escolar geral exigida para ingresso, informações sobre o currículo, funções do auxiliar, entre outras.
Uma análise sumária de algumas informações contidas mostra alguns aspectos surpreendentes: das 420 escolas catalogadas (as da China não constam da publicação), 349 (83,1%) estão localizadas em países desenvolvidos, donde se conclui que, se o uso de auxiliar é recomendado como sendo de utilidade para as áreas em desenvolvimento, são justamente as áreas desenvolvidas que os estão usando. Na URSS estão 281 dessas escolas (para formação de "feldshers"); os Estados Unidos têm 49, o Canadá 9, a Bulgária e a Polônia 5 cada. Sobram 71 (16,9%) para os países em desenvolvimento; dessas, 42 estão na África, 15 na Ásia, 6 na América Latina, 3 na Oceania, 3 na Europa e 2 no Oriente Médio.
Das 71 localizadas em áreas em desenvolvimento, 4 (5,6%) apareceram antes de 1950; 14 (19,7%) na década de 50, 25 (35,2%) na década de 60 e 28 (39,5%) de 1970 em diante.
Publicações relatando algumas experiências ou chamando a atenção para aspectos teóricos do problema têm sido comuns na literatura. Recentemente a OMS7 (1977) distribuiu uma edição experimental de um manual destinado aos auxiliares primários, o que, seguramente, é um indício de que se está passando a dar importância maior a esse profissional.
Fonte:Scielo