Enquanto Lula baseia sua narrativa em juízos pessoais, Boric e Lacalle fundamentam a deles em dados concretos.
reuniões Latino-Americanas de 2023 |
Os diálogos entre os presidentes chileno e uruguaio, Gabriel Boric e Luis Lacalle, respectivamente, e o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva.
A pauta central desses diálogos: a inclusão da Venezuela nas reuniões latino-americanas, uma questão que até então parecia inquestionável. No entanto, o que tornou essa discussão um impasse foi a perspectiva apresentada por Lula, que invalidava a narrativa predominante sobre a Venezuela.
Lula e sua narrativa
As observações de Lula refutavam a visão de que o governo venezuelano é autoritário, quiçá autocrático, e que desrespeita os direitos humanos e as normas democráticas, apesar de ter sua origem nas urnas. No entanto, Lula deixou de mencionar que essa imagem se baseia em dados concretos, como os testemunhos documentados no relatório de 2019 elaborado pela Comissão Bachelet, sob os auspícios da ONU, entre outros relatórios igualmente contundentes.
Boric e Lacalle: uma abordagem real e diferente
Contudo, tanto Boric quanto Lacalle, não tinham a intenção de impor condições a Nicolás Maduro, nem questionar a presença da Venezuela na cúpula sul-americana de 2023, realizada em Brasília em 30 de maio. Foi Lula quem propôs uma revisão das concepções predominantes sobre o governo Maduro, criando assim as condições para uma possível exclusão.
Os motivos por trás da atitude de Lula
Lula, como é notório, almeja figurar como um líder de alcance continental e um estadista que comanda uma nação de grande magnitude. O Brasil, agora classificado como uma potência emergente, integra um plano macro gerido por Pequim. Este plano tem dois objetivos claros: um de curto prazo e outro de longo alcance. No curto prazo, busca formar uma frente de nações "não alinhadas" sob a égide chinesa para mediar o conflito entre Rússia e Ucrânia. Essa frente, conhecida como "clube da paz" nas palavras de Lula, incluiria nações como Índia, África do Sul, Irã, possivelmente Arábia Saudita e, é claro, o Brasil.
A importância estratégica da Venezuela
Aqui, o leitor pode estar se perguntando qual é a conexão entre isso e Maduro. A relação é mais profunda do que se imagina. Sob o governo Maduro, a Venezuela é uma aliada da Rússia de Putin e, ao mesmo tempo, configura-se como um parceiro econômico, político e até militar da China. Maduro, portanto, poderia assumir um papel significativo no tabuleiro político russo-chinês. Não surpreende que Sergei Lavrov, emissário internacional de Putin, tenha viajado para a América Latina em abril, interagindo com os governos de Cuba, Nicarágua, Venezuela e Brasil. Esses são precisamente os países que o eixo Rússia-China enxerga como possíveis aliados na América Latina.
A complexa relação China-Brasil e sua ramificação para Maduro
A complexidade do projeto China-Brasil reside no fato de que, junto com Daniel Ortega, Maduro é quase que universalmente estigmatizado. No entanto, os presidentes Lacalle e Boric exerceram seu direito de se opor à tentativa de Lula de ocultar Maduro. A postura de Lacalle, profundamente contrária a todas as formas de antidemocracia, é explicável. Por outro lado, Boric, representante da esquerda chilena, segue a trajetória delineada por seus predecessores, como Ricardo Lagos e Michelle Bachelet, que se manifestaram contra as violações dos direitos humanos na Venezuela.
A continuidade da postura de Boric
A continuidade de Boric com relação à abordagem de seus antecessores é fundamental, considerando as tendências emergentes no Chile. Com o surgimento do nacionalismo populista de direita, liderado por José Antonio Kast, e o apoio crescente à ditadura de Pinochet, Boric compreende que a defesa dos espaços democráticos é essencial. Ele rejeita a narrativa enganosa de Lula e se pronuncia contra as sanções dos EUA à Venezuela, buscando equilibrar suas posições sobre Maduro e distanciar-se de uma fração antidemocrática da oposição venezuelana liderada por Juan Guaidó.
A novidade representada por Boric
Boric emerge como uma novidade no contexto latino-americano, vindo de um país distante dos holofotes internacionais e com apoio nacional limitado. No entanto, ele compreende que a principal tarefa atual é defender os espaços democráticos em face da crescente onda autocrática, uma narrativa absolutista na qual Lula está inserido.
Política como debate e divisão
Em última análise, a política é um debate e uma divisão que conduzem à unidade. Os líderes políticos precisam compreender que a política não é sobre imposição de unidade, mas sobre a unidade que emerge do diálogo e do debate. O passado nostálgico de Lula, quando malas cheias de dinheiro circulavam, não tem lugar na política. Na política, a irmandade não existe, e é assim que deve ser.
Conclusão
A atitude de Lula, Boric e Lacalle nas reuniões latino-americanas de 2023 revela o contraste na natureza de suas exposições. Enquanto Lula baseia sua narrativa em juízos pessoais, Boric e Lacalle fundamentam a deles em dados concretos. A política latino-americana está em constante evolução, e o debate em torno da Venezuela é apenas um exemplo do complexo cenário político da região. À medida que os líderes enfrentam desafios e tomam decisões, a política continua a ser um campo onde a unidade emerge da diversidade de opiniões.
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Editado do texto de Fernando Mires
Historiador e escritor chileno. Professor emérito da Universidade de Oldenburg, Alemanha. Formou-se professor de História e possui pós-graduação em História Moderna. Em 1991 recebeu o título de Privat Dozent, o mais alto grau acadêmico conferido pelas universidades alemãs.
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