Meningite, uma doença sob a luz da cidade
Campanha de vacinação de 1975, no bairro da Lapa |
A década de 70 foi marcada por uma sombra sinistra que pairou sobre a cidade de São Paulo: a epidemia de meningite. Um capítulo sombrio da história da medicina brasileira, este surto devastador desafiou não apenas a saúde pública, mas também a capacidade das autoridades de lidar com uma crise de saúde de grande escala. Neste artigo, exploraremos em detalhes a epidemia de meningite dos anos 70, suas causas, consequências e as ações tomadas para combatê-la.
A Epidemia que assombrou São Paulo
Nos anos 70, São Paulo estava mergulhada em uma das maiores epidemias de meningite já registradas no país. A doença, que afeta as membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal, se espalhou como fogo em palha seca. Todos os bairros da cidade foram atingidos, e a média de óbitos alcançou assustadores 1,15 por dia.
Em contraste com a letalidade que variou entre 12% e 14% nos anos anteriores, a partir de 1973, houve uma acentuada queda, atingindo seu ponto mais baixo, 7%, em 1974. O que causou essa mudança? A troca de presidente, com a entrada do General Ernesto Geisel, em 1974, desempenhou um papel fundamental na mudança de atitude das autoridades. Foi criada a Comissão Nacional de Controle da Meningite, que traçou a política de vigilância epidemiológica.
Uma campanha de vacinação desafiadora
Em março de 1975, um plano ousado foi elaborado para vacinar 10 milhões de pessoas em apenas quatro dias. A operação foi liderada pelo exército. Curiosamente, a campanha não emitiu comprovantes de vacinação, tornando difícil o rastreamento das pessoas imunizadas. No entanto, a cobertura estimada foi de cerca de 93% na cidade.
Após a campanha, os casos começaram a diminuir, mas levou dois anos para retornarem aos valores endêmicos. Até julho de 1977, ainda eram registradas incidências acima do esperado. A partir desse ano, os casos causados pelo sorogrupo A não foram mais identificados, enquanto os do sorogrupo C voltaram ao nível endêmico. São Paulo finalmente voltou à sua rotina, livre dessa epidemia implacável.
A progressão da epidemia: da periferia para o centro
A epidemia de meningite avançou de maneira assustadora, começando nas áreas periféricas e se espalhando em ondas em direção ao centro da cidade. Durante o primeiro semestre de 1974, não houve um único distrito sem registro de casos. As regiões mais pobres sofreram mais, o que era esperado, considerando a rápida expansão das favelas na década de 70.
Em 1957, São Paulo tinha 141 favelas; em 1973, esse número saltou para 525. A zona sul era a região com a maior concentração de população favelada na época. A miséria acelerada naturalmente levou ao aumento da disseminação da doença.
A progressão da epidemia foi implacável. Começou pela zona sul em maio de 1971, atingindo a zona leste em novembro do mesmo ano. Em junho de 1972, a zona norte estava infectada, e a doença se espalhava rapidamente. Finalmente, em setembro de 1973, o centro foi atingido, e todos os seus distritos foram afetados em apenas 11 meses. As taxas de incidência variaram de 13,04 casos por 100 mil habitantes no distrito da Aclimação a 101,28 na Vila Nova Cachoeirinha.
Limitações e omissões: a luta contra a epidemia
Enquanto as autoridades sanitárias negavam a existência da epidemia, os médicos da Secretaria de Estado da Saúde tentavam controlar a doença. Eles se concentraram em aprimorar o conhecimento sobre a quimioprofilaxia e avaliar novas vacinas. Em 1972, a vacina contra o meningococo C, que já era administrada aos militares norte-americanos no Vietnã, foi testada em crianças de seis meses a seis anos em São Paulo.
A distribuição etária da doença mudou durante a epidemia, deslocando-se em direção a grupos etários mais velhos. Em 1974, as taxas de incidência atingiram níveis alarmantes em crianças com menos de um ano e em pessoas com 50 anos ou mais. A letalidade também sofreu modificações, com taxas mais altas entre os menores de um ano e o grupo de 10 a 14 anos.
Conclusão: uma epidemia superada
A epidemia de meningite que assolou São Paulo nos anos 70 foi uma tragédia que testou a capacidade das autoridades e da medicina brasileira. No entanto, graças a ações decisivas, como a campanha de vacinação em massa e a criação da Comissão Nacional de Controle da Meningite, a cidade finalmente superou essa terrível doença.
Hoje, olhando para trás, podemos aprender valiosas lições sobre o controle de epidemias e a importância da cooperação entre autoridades e profissionais de saúde. A história da medicina nos lembra que a resiliência e a determinação podem superar os desafios mais assustadores.
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Com Agências :
*José Cássio de Moraes, epidemiologista, professor-adjunto do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Santa Casa de São Paulo, ex-conselheiro do Cremesp e ex-diretor do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo.
*Rita de Cássia Barradas Barata é especialista em Medicina Preventiva, professora –adjunta do Departamento de Medicina Social da FCM da Santa Casa de São Paulo.
Ambos são autores da obra “O livro da meningite, uma doença sob a luz da cidade”, em conjunto com a jornalista Cristina Fonseca.
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