No estudo publicado no The Lancet Infectious Diseases, Maria Ubals e colaboradores evidenciaram que o uso de linezolida 600 mg, administrada por via oral uma vez ao dia durante cinco dias, não se mostrou eficaz no tratamento da sífilis. A sífilis, uma enfermidade sexualmente transmissível causada pela bactéria Treponema pallidum subespécie pallidum, representa um crescente desafio de saúde pública global. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2020, foram registrados 7,1 milhões de novos casos de sífilis em adultos em todo o mundo. A prevalência da sífilis congênita também está em ascensão, atingindo 425 casos por 100.000 nascidos vivos, o que torna cada vez mais difícil alcançar o objetivo de erradicação estabelecido pela OMS.
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A sífilis pode ocasionar graves complicações médicas e aumentar o risco de aquisição e transmissão do vírus da imunodeficiência humana (HIV) entre duas a cinco vezes. Atualmente, a recomendação para o tratamento de todas as fases iniciais da sífilis, tanto pela OMS quanto pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, é a administração de penicilina G benzatina por via intramuscular, em dose única de 2,4 milhões de unidades. Vale ressaltar que a penicilina é o único tratamento recomendado para mulheres grávidas, e quando administrada a uma mãe infectada no início da gestação, previne a transmissão vertical da doença.
A atual escassez de penicilina benzatina representa uma crise de saúde pública e destaca a urgência de identificar opções alternativas de tratamento. Embora existam algumas alternativas à penicilina, cada uma apresenta suas limitações. A doxiciclina oral, administrada duas vezes ao dia durante 14 dias, é a alternativa recomendada pelo CDC quando a penicilina é contraindicada ou indisponível. No entanto, não é recomendada durante a gravidez e em crianças pequenas. A azitromicina oral tem demonstrado eficácia no tratamento da sífilis precoce, mas o surgimento de resistência limitou seu uso. Por sua vez, a ceftriaxona, uma cefalosporina de terceira geração, requer injeções intramusculares ou intravenosas diárias durante 10 a 14 dias, o que torna esse regime inconveniente e impraticável na maioria dos ambientes clínicos. Durante a gestação, devido aos dados limitados sobre a eficácia e segurança desses regimes alternativos, as mulheres grávidas com alergia à penicilina devem ser submetidas à dessensibilização à penicilina.
Ubals e colaboradores conduziram um ensaio multicêntrico, prospectivo, aberto, de não inferioridade, randomizado e controlado para avaliar a eficácia da linezolida no tratamento da sífilis primária, secundária e precoce. Este foi o primeiro estudo em humanos avaliando a linezolida para o tratamento da sífilis. O regime de tratamento experimental consistiu na administração oral de linezolida 600 mg, uma vez ao dia, durante cinco dias, e foi comparado à administração intramuscular de 2,4 milhões de unidades de penicilina G benzatina. Entre os 59 participantes analisados, designados aleatoriamente para receber linezolida (n=29) ou penicilina G benzatina (n=30), a taxa de sucesso do tratamento 48 semanas após o tratamento foi substancialmente inferior no grupo que recebeu linezolida. Dos 27 participantes que receberam linezolida, apenas 19 (70%) alcançaram sucesso no tratamento, em comparação com 28 (100%) dos 28 participantes que receberam penicilina G benzatina. Os autores utilizaram uma medida composta de critérios clínicos, sorológicos e microbiológicos para garantir uma classificação precisa do desfecho primário. Além disso, conseguiram diferenciar entre casos de falha de linezolida e reinfecção por meio da análise genômica do Treponema pallidum. O ensaio foi interrompido precocemente devido à diferença de 30% na taxa de sucesso entre o grupo que recebeu linezolida e o grupo que recebeu penicilina G benzatina. Como medida de segurança, a equipe do estudo continuará acompanhando os participantes tratados com linezolida até 24 meses após a inscrição, garantindo tratamento adequado e ausência de recorrência da infecção.
Apesar do resultado negativo, alguns pontos importantes precisam ser destacados. A linezolida demonstrou ser eficaz contra o Treponema pallidum tanto in vitro quanto em estudos in vivo em coelhos, utilizando uma duração e dosagem equivalentes. No entanto, apesar dos resultados promissores em estudos pré-clínicos, no ensaio clínico liderado por Ubals, apenas 70% dos participantes foram tratados com sucesso. Considerando que o Treponema pallidum é uma bactéria de crescimento lento e que se dissemina de forma sistemática, provavelmente é necessária uma duração de tratamento mais longa e uma dosagem mais frequente, como sugerem as simulações farmacocinéticas. Além disso, no estudo em animais, apenas uma única cepa (SS14) foi utilizada para avaliar a eficácia da linezolida, enquanto no ensaio clínico, apenas 12 das 28 cepas clínicas isoladas pertenciam ao clado SS14. Portanto, são necessárias mais pesquisas para avaliar a linezolida em doses mais elevadas e por um período mais prolongado, além de avaliar sua eficácia em cepas adicionais de Treponema pallidum.
O resultado negativo do ensaio não deve desencorajar pesquisadores, autoridades de saúde pública ou autoridades reguladoras de continuarem a realizar e apoiar estudos para o aproveitamento de antibióticos mais antigos e amplamente disponíveis no tratamento da sífilis. Essa abordagem pode representar uma estratégia rápida e de baixo custo, aproveitando o perfil clínico conhecido e a segurança
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🖥️ FONTES :
https://www.thelancet.com/action/showPdf?pii=S1473-3099%2823%2900693-X
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